Ele gosta de tapas, ela adora caracóis; ele fala espanhol, ela é portuguesa; conhecem-se em Évora e apaixonam-se. Mas o pai de Diana, até aí um fervoroso admirador do país vizinho, não quer ouvir falar do romance com Rafael.
A explicação pode estar numa certa noite, vinte anos antes, em que traiu a mulher, prestes a dar à luz, com uma espanhola chamada Carmen…
«Lena exasperou-se.
– Mas que fixação, Nélson! Até parece que aquilo não é só um namorico. Fazes impressão. Nem quero pensar no dia em que fores avô!
– Eu quero lá um neto meio castelhano!
– O rapaz é andaluz – protestou Lena, acrescentando:
– Andaluces de Jaen, como os do Paco Ibañez – uma tentativa de apaziguar o marido, invocando um dos seus cantautores favoritos. Talvez Nélson começasse a cantarolar, ele que era muito atreito ao reflexo
condicionado. Não funcionou.
– Badajoz é Extremadura, não interessa, Andaluzia, Castela, é tudo mau vento e mau casamento – declarou e passou a explicar à mulher quem constituía a tropa espanhola que Nun’Álvares derrotou em Aljubarrota.
Inventou o saber no momento, coisa que só fazia em casos extremos, quando necessitava de um argumento de autoridade, mas era o caso.
– Os extremenhos são piores que os andaluzes, Lena, uns selvagens. Se não fosse a táctica do quadrado, que o Santo Condestável inventou, e por isso é santo, aliás, hoje estávamos todos a tortilhas. Gostavas? Não havia
pastéis de bacalhau, não havia cozido, não havia nada.»